

O Universo a falar comigo e a explicar como todos os dias se recebem "presentes" de natal...
As férias de verão corriam sempre em grande aceleração e dentro das brincadeiras que a malta gostava, havia uma que era do agrado de todos.
As corridas de Bicicleta.
Eu tinha uma trotineta vermelha, e era com ela que me divertia, mas sendo já crescido gostava de ter outra coisa mais evoluída.
Como prenda da minha passagem para o 7º ano, os meus pais deram-me uma Bicicleta. Uma Caloi Berlineta.
Que prenda mais fantástica, e como eu adorei o dia em que a fomos buscar a Lisboa, uma loja que havia ali na Almirante Reis, ao pé do Banco de Portugal.
Ela era verde, e ao meio tinham uma tranca que permitia dobrar a bicicleta, para assim ser mais fácil o seu transporte de carro.
Há uns anos trabalhei lá perto e ainda existia essa loja, mas hoje em dia é um Restaurante.
Como dizia, grandes brincadeiras e corridas nós fazíamos com as nossas "bikes". Estrada acima rua a baixo saltar montes e derrapar com o pneu traseiro.
Para dar mais estilo, eheheeh os miúdos são terríveis, púnhamos umas cartas das de jogar, presas com molas nos raios da roda de traz, e aquilo parecia um barulho de mota.
A minha mãe ADORAVA ver-me ao fim do dia com as calças cheias de óleo da corrente e braços e mãos negros como o alcatrão da estrada.
Corríamos algum perigo, pois íamos a pedalar pelas estradas até Sintra, circulando ao lado de carros.
Eu acho que os nossos pais nunca souberam destas loucas viagens. Para eles andávamos sempre por ali perto.
Os gaiatos tinham-se transformado em pequenos adolescentes em que começa a despertar a idade de toda a irreverência.
Que saudades tenho dessa escola, a António Sérgio.
Alguns amigos, que me tinham acompanhado desde a 1ª classe continuava-mos todos juntos na mesma turma, 1º ano Turma C. O meu número eram o 25.
A minha turma, tinha as aulas de tarde, só as 4ª é que havia 3 horas de manha, 1 hora de Religião e Moral e 2 horas de Ginástica. Ahahahaah, depois de uma ida ao céu, jorrava-mos suor a potes de tanto correr.
O Vítor, o Jacinto, o Cabrita, o Rogério, o Luís, e acho que havia mais 1 ou 2, mas não me lembro do nome deles. Naquela altura, os rapazes brincavam pouco com as raparigas, outros tempos, por isso das miúdas não sei mesmo o nome das que também ficaram na mesma turma.
No primeiro dia da escola, fui com os meus pais, todo aprumadinho e com a mochila cheia de material escolar.
Nós que tivemos poucos livros na primária, agora era 1 por cada disciplina, e elas eram 10, fora os cadernos, lápis, canetas, compasso, réguas, esquadro, sem esquecer também os ténis, calções e camisola de ginastica.
Como seria toda esta gestão de material, para putos como nós que de organização pouco tinham e adoravam era a bola e correrias.
A apresentação foi feita na 1ª aula, de Português, onde o Director de turma deu as boas vindas a todos e desejo de bons estudos. Umas atrás das outras, as aulas que tínhamos para esse dia, foram todas de apresentação.
Novos colegas conheci, e nessa noite à mesa de jantar a conversa era só uma... O meu primeiro dia da Secundária
Pouca coisa fizemos relacionado com estudos, aprendi as letras os números a escrever algumas coisas, e pouco mais. O ensino atravessava uma grande confusão.
As aulas iriam ficar suspensas até Outubro, os tempos de brincadeira com os novos amigos e dos trabalhos escolares, mas viriam dias de manhãs fartas em correrias, onde os índios e cowboys andariam atrás uns dos outros, onde no descampado lá do bairro, as fortes balizas de paus queimados revestidas de serapilheiras routas, iriam ser fortemente bombardeadas por potentes remates de jogadores ávidos de gritar... GOLOOOOOO, e tardes quentes de corridas de caricas e jogos do pião.
Que bom seria, voltar novamente aquela canseira... de nada fazer e tudo acontecer.
Dizia-me a minha mãe...são as tuas primeiras férias grande. e para mim isso era algo de novo, e estranho, pois sinceramente a escola não foi assim tão difícil.
Os rapazolas em aventuras destemidas mas muito arreliadoras para as mães, deixavam aquela rua num estado de autentica revolução, onde tudo servia para por em prática novas brincadeiras.
Uma das mais perigosas, mas que nos dava grande prazer era a de imaginárias "guerras" pacíficas praticadas por crianças santas, pois subíamos às grandes arvores e ao telhado do velho palheiro da quinta do Sr. Zé, empunhando fisgas feitas de câmaras-de-ar de pneus velhos e armas toscas em pau de figueira e tábuas das caixas da fruta.
A quinta tinha 2 grandes poços de água para a rega, e depois das "batalhas" a malta bebia água dai. Acredito que aquilo não deveria ser lá muito bom, mas puto é puto, e não se liga a isso. Ainda nos chamavam mariquinhas e isso para um guerreiro não pode acontecer...ahaahaahah
Ao fim do dia, todos nós sentados na margem do lago que se formava lá no fundo da quinta, e onde as rãs em fim de tarde grande alarido faziam, combinávamos novas estratégias para o dia seguinte.
Em 1974, o poder de compra era baixo, as pessoas tentavam poupar o máximo possível (não será o mesmo que hoje em dia?) e as extravagancias a ter eram controladas, onde o pão e vinho sobre a mesa, já dizia a música, não poderia faltar nem algumas guloseimas, que fariam as delícias das pequenas crianças.
Nessa noite de natal, após muito apelar a forças supremas vindas da Lapónia, o tal Senhor barbudo não apareceu, e triste fiquei, apesar de não termos chaminé em casa dos meus pais, ele poderia ter entrado pela janela da cozinha. Mas não apareceu.
Pensava eu que afinal era tudo uma grande mentira, Pai Natal não existia, e andavam a enganar todos os miúdos lá da minha rua e da minha escola.
Na manhã seguinte, dia de Natal, a surpresa aconteceu, tive aquilo que tanto desejava, uma espingarda lança bolas que deveriam acertar em bocas de ferozes animais vindos da selva, e que na caixa estavam desenhados.
Aquele brinquedo era o sonho de qualquer miúdo da minha idade, em que a maldade do acto estava oculto na inocência da idade.
E claro que Natal não é Natal, se não houver umas peúgas oferecidas pela avó e uma par de cuecas que a minha mãe diz fazerem-me falta.